Tenho anotações para diários de viagens que estão pendentes,
mas creio que não há clima, nem vontade e nem sentido em escrever sobre
essas coisas. E o problema é apenas meu. Não é culpa do governo ou da pandemia.
A culpa é apenas minha, pois não consigo desviar meus olhos dos ratos e
do dragão, como nenhum homem vivo consegue, depois que os vê pela
primeira vez.*
A vida moderna, especialmente essa, vivida na internet, me passa uma impressão de que tudo pode ser romantizado. Trilhas sonoras são usadas para induzir sentimentos. Ilustrações traduzem as dores e palavras bonitas emocionam. Tudo perfeitamente editado como numa produção original Netflix.
Mas a verdade que assombra é que a realidade não poderia estar mais distante disso. Porque nesse intervalo que chamamos de vida, todos sabemos, talvez sem a devida consciência, que tudo passa, tudo passará.
Sim, tudo passa. Inevitavelmente.
Um dia você dará seus últimos passos; literais ou não. E dirá suas últimas palavras; lúcidas ou não.
Nesse dia, não haverá uma trilha sonora para dar peso à sua dor. Não haverá um flashback em câmera lenta com seus melhores momentos, olhares e sorrisos. Você estará diante de uma jornada solitária. Uma passagem misteriosa da qual pouco ou nada se sabe e sobre a qual ninguém sabe o destino, exceto aqueles que já passaram por ela. E estes certamente não voltaram e nem voltarão para contar.
É o que se sabe até agora. Todo o resto sobre a vida (ou o fim dela), está no campo da filosofia, da fé, das crenças ou crendices.
Em suas últimas horas neste mundo dos vivos, farão uma reunião conhecida como funeral. E você estará lá. Mas não se preocupe! Sua consciência, não. O que é uma bênção, pois é lá que, em seu louvor, apresentarão um teatro de falsas virtudes. Farão de você um herói, mesmo que tenham te ignorado a vida toda. Falarão por você, contarão suas histórias e mentirão a seu respeito. Dirão coisas que você nunca disse ou fez. Sorrirão e se esquecerão de onde estão e motivo de estarem ali. Mas se lembrarão e, de repente, se mostrarão consternados. Dirão: "Meus pêsames, sinto muito pela sua perda" aos seus familiares mais próximos e, no dia seguinte, declararão direito sobre os seus bens - isso se você deixar algum.
A vida moderna, especialmente essa, vivida na internet, me passa uma impressão de que tudo pode ser romantizado. Trilhas sonoras são usadas para induzir sentimentos. Ilustrações traduzem as dores e palavras bonitas emocionam. Tudo perfeitamente editado como numa produção original Netflix.
Mas a verdade que assombra é que a realidade não poderia estar mais distante disso. Porque nesse intervalo que chamamos de vida, todos sabemos, talvez sem a devida consciência, que tudo passa, tudo passará.
Sim, tudo passa. Inevitavelmente.
Um dia você dará seus últimos passos; literais ou não. E dirá suas últimas palavras; lúcidas ou não.
Nesse dia, não haverá uma trilha sonora para dar peso à sua dor. Não haverá um flashback em câmera lenta com seus melhores momentos, olhares e sorrisos. Você estará diante de uma jornada solitária. Uma passagem misteriosa da qual pouco ou nada se sabe e sobre a qual ninguém sabe o destino, exceto aqueles que já passaram por ela. E estes certamente não voltaram e nem voltarão para contar.
É o que se sabe até agora. Todo o resto sobre a vida (ou o fim dela), está no campo da filosofia, da fé, das crenças ou crendices.
Em suas últimas horas neste mundo dos vivos, farão uma reunião conhecida como funeral. E você estará lá. Mas não se preocupe! Sua consciência, não. O que é uma bênção, pois é lá que, em seu louvor, apresentarão um teatro de falsas virtudes. Farão de você um herói, mesmo que tenham te ignorado a vida toda. Falarão por você, contarão suas histórias e mentirão a seu respeito. Dirão coisas que você nunca disse ou fez. Sorrirão e se esquecerão de onde estão e motivo de estarem ali. Mas se lembrarão e, de repente, se mostrarão consternados. Dirão: "Meus pêsames, sinto muito pela sua perda" aos seus familiares mais próximos e, no dia seguinte, declararão direito sobre os seus bens - isso se você deixar algum.
E é por todos estes motivos que, na minha opinião, este
é um costume que deve ser o mais breve possível. Algumas poucas horas são mais do que suficientes para que os verdadeiros enlutados façam sua despedida e sejam poupados de um festival de fingimento e dissimulação. Até porque, nada
que não tenha sido feito até então, terá alguma importância ou fará
alguma diferença neste momento.
Mas, mais do que seus bens - se é que os deixou - o que será de sua memória, de suas lutas e sacrifícios, de suas vitórias e lições, suas derrotas e decepções, de suas relações pessoais e, sobretudo, daqueles que eram verdadeiramente seus? Por quê? E em troca de quê, tudo isso? A resposta para estas perguntas é: não importa!
Todas essas coisas começarão a ser esquecidas e abandonadas no mesmo momento em que seu corpo descer à sepultura.
Tem sido assim e parece ser este o curso natural da vida que, de alguma forma, tem que continuar para aqueles cujo amor por você era - e sempre será - incondicional. Para estes, sua falta deixará um buraco no coração, um vazio na alma, dúvidas, medos e, provavelmente, culpas. Uma falta que não pode ser atenuada e uma ausência física em constante conflito com as lembranças ainda vivas interrompendo a qualquer momento seus afazeres. É bem provável que seja esta a mais certa e verdadeira definição da palavra Saudades.
Em alguns casos, tudo isso pode significar também uma radical transformação na forma de enxergar a vida. Para alguns, tudo pode ganhar um novo significado, um recomeço. Para outros, tudo pode perder completamente o sentido e, de repente, a vida pode se transformar numa estúpida agenda de compromissos sem nexo mas, sem a qual, a própria sobrevivência se tornaria inviável.
É claro que sempre haverá mel nas folhas dos arbustos, mas este não passa de vaidade e nem é doce o suficiente para fazer esquecer o dragão e os ratos*.
Tem sido assim e parece ser este o curso natural da vida que, de alguma forma, tem que continuar para aqueles cujo amor por você era - e sempre será - incondicional. Para estes, sua falta deixará um buraco no coração, um vazio na alma, dúvidas, medos e, provavelmente, culpas. Uma falta que não pode ser atenuada e uma ausência física em constante conflito com as lembranças ainda vivas interrompendo a qualquer momento seus afazeres. É bem provável que seja esta a mais certa e verdadeira definição da palavra Saudades.
Em alguns casos, tudo isso pode significar também uma radical transformação na forma de enxergar a vida. Para alguns, tudo pode ganhar um novo significado, um recomeço. Para outros, tudo pode perder completamente o sentido e, de repente, a vida pode se transformar numa estúpida agenda de compromissos sem nexo mas, sem a qual, a própria sobrevivência se tornaria inviável.
É claro que sempre haverá mel nas folhas dos arbustos, mas este não passa de vaidade e nem é doce o suficiente para fazer esquecer o dragão e os ratos*.
Também está claro que não adianta tentar afogar todas estas questões na embriaguez da
vida, e viver num estado de torpor ressentido. É preciso encontrar uma saída.
Tolstói, em determinado trecho de seu livro "A Confissão", enxerga quatro saídas para esta "brincadeira tola" que chamamos de vida.
"Uma saída: não entender que a vida é: absurdo, vaidade e crueldade. E que o melhor é não viver. - Eu não podia deixar de saber disso e, uma vez que sabia, não podia fechar os olhos.
Outra saída: aproveitar a vida como ela é, sem pensar no futuro. - Isso eu não podia fazer. A exemplo de Sákia Múni, eu não podia sair para passear, uma vez que sabia da existência do sofrimento, da velhice e da morte. Eu tinha uma imaginação muito viva. Além do mais, não podia me alegrar com o acaso momentâneo que punha um prazer passageiro em meu caminho.
Terceira saída: uma vez compreendido que a vida é crueldade e absurdo, dar um basta, matar-se. - Eu entendia isso, mas, por alguma razão, ainda não me matava.
Quarta saída: viver na situação de Salomão (o Rei) e Schopenhauer. - saber que a vida é uma brincadeira tola que fizeram comigo e, mesmo assim, continuar a viver, lavar-me, trocar de roupa, almoçar, falar e até escrever livros. Para mim, isso era repulsivo, torturante, mas eu ainda permanecia nessa situação."
Tolstói, em determinado trecho de seu livro "A Confissão", enxerga quatro saídas para esta "brincadeira tola" que chamamos de vida.
"Uma saída: não entender que a vida é: absurdo, vaidade e crueldade. E que o melhor é não viver. - Eu não podia deixar de saber disso e, uma vez que sabia, não podia fechar os olhos.
Outra saída: aproveitar a vida como ela é, sem pensar no futuro. - Isso eu não podia fazer. A exemplo de Sákia Múni, eu não podia sair para passear, uma vez que sabia da existência do sofrimento, da velhice e da morte. Eu tinha uma imaginação muito viva. Além do mais, não podia me alegrar com o acaso momentâneo que punha um prazer passageiro em meu caminho.
Terceira saída: uma vez compreendido que a vida é crueldade e absurdo, dar um basta, matar-se. - Eu entendia isso, mas, por alguma razão, ainda não me matava.
Quarta saída: viver na situação de Salomão (o Rei) e Schopenhauer. - saber que a vida é uma brincadeira tola que fizeram comigo e, mesmo assim, continuar a viver, lavar-me, trocar de roupa, almoçar, falar e até escrever livros. Para mim, isso era repulsivo, torturante, mas eu ainda permanecia nessa situação."
A quarta saída é justamente onde me encontro. Como que esperando que algo traga a resposta para a pergunta que não me deixa em paz.
PS: Todo este texto é baseado na obra "A Confissão", de Tolstói que, até este ponto, traduz em boa parte os questionamentos deste espírito inquieto e misantropo.
PS: Todo este texto é baseado na obra "A Confissão", de Tolstói que, até este ponto, traduz em boa parte os questionamentos deste espírito inquieto e misantropo.
Tolstói termina sua obra encontrando as respostas que tanto buscava. Espero encontrá-las também.
Obrigado por ler até aqui!
Até a próxima!
Fabior
Fabior
Trilha sonora sugerida: